Serres, M. (2018). Antes é que era bom! Lisboa, Portugal: Guerra & Paz, 100 p.
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A edição ora resenhada teve seu lançamento no ano de 2018 em Portugal, na interessante série ‘livros vermelhos’ da editora Guerra & Paz, sendo o penúltimo livro do filósofo francês Michel Serres. Em junho do ano seguinte, pouco mais de três meses de lançar seu último livro Morales Espiègles (Moral Travessa, em tradução livre), falece em Vincennes (França), rodeado por seus familiares, como informou, à época, sua editora Sophie Bancquart.
Muitas vezes chamado de ensaísta, como uma crítica, aos seus livros, artigos, ensaios, Serres pertenceu a uma geração de filósofos que navegaram com êxito por diversas áreas do conhecimento, com uma formação acadêmica e professional tão variada como engenheiro naval e, posteriormente, filósofo. Em uma das oportunidades em que esteve no Brasil, elogiou o título dado à sua reflexão acerca da educação, ‘Filosofia Mestiça’ (1993) que tem no Brasil o único país com essa tradução, muitas edições levam o nome em francês Le tiers-instruit, a italiana com Il mantello di Arlecchino(1992), em inglês como The troubadour of knowledge (1997), pois a mestiçagem exige o novo, o conhecimento novo com suas cores, sons e imagens renovadas, propondo e mostrando que em ciência – e na vida – não temos soluções únicas e eternas. Valorizar a mestiçagem na aprendizagem evita o culto do velho, do ultrapassado que muitos professores creem ser o melhor.
Utilizando a imagem da Polegarzinha, a menina que utiliza seus polegares para descobrir o mundo com seu celular e o Velho Ranzinza, aquele (francês) que é tomado pela fúria diariamente, “resmunga, critica... estes coléricos dizem à desempregada ou a estagiária Polergarzinha quye pagará durante muito tempo a vida dos aposentados: Antes é que era bom!” (11-12).
Com esse título, propositalmente irônico, “gritado” na capa do livro com letras maiúsculas as palavras ANTES...ERA BOM! Michel Serres nos mostra em 33 textos, distribuídos nas 100 páginas, que bom é o futuro, o qual ainda é possível construí-lo.
Começando com o texto Caudillo, Duce, Führer, Grande Timoneiro... nos apresenta, logo na entrada, que são “todos eles pessoas de bem, requintados especialistas em campos de extermínio, torturas, execuções sumárias, guerras, depurações” (p. 13). Em muitas de suas entrevistas alertava dos horrores das guerras, pelo fato de sua geração ter vividos tantas delas.
Em Contrato Natural (23-25) Serres reflete a destruição do planeta provocada pela revolução industrial e suas filosofias que retratavam o homem finito e o mundo infinito com seu auge na destruição atômica de Hiroxima que alertou o mundo e possibilitou a inversão dos valores. Nessa inversão, coube às Polegarzinhas a tarefa de sair em defesa do planeta, “enquanto o Velho Ranzinza votava pelos homens e só por eles”, elas lutavam e lutam, vide Greta Tintin Eleonora Ernman Thunberg.
Encaminhando um final, ‘Pequenez’ reflete acerca dos pseudogigantes que agonizaram porque quiseram levar a melhor sobre os demais, feito Hitler a suicidar-se em seu bunker; das grandes civilizações, “por que quiseram levar a melhor sobre todas, tornar-se a maior, a mais forte, a primeira e, para tal, destruir as outras” (95-6). Polegarzinhas não buscam e não querem protagonismo, são conhecidas e reconhecidas exatamente por sua pequenez Ao concluir, Serres clama “queridas Polegarzinhas, queridos Polegarzinhos, não o digam aos vossos velhos, entre os quais me incluo, é muito melhor hoje: a paz, a longevidade, a paz, os antálgicos, a paz, a Segurança, a paz... (99).
Um final singelo para um livro que nos oferece tantas informações, reflexões e conhecimentos sem necessidade de recorrer aos referentes comuns de um trabalho científico - por notas de rodapé, descrições, fotos, diagramas, instrumentação, alusões – Michel Serres nos indica em seus textos, caminhos para ler o mundo contemporâneo.
- Roberta Lins GREGÓRIO LOUSADA
- Doutoranda em Comunicação e Cultura pela Universidade de Sorocaba, São Paulo, Brasil
- https://orcid.org/0000-0002-2762-9605
- robertagregorio@yahoo.com
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